Síria: potências estrangeiras apoiaram 13 anos de guerra contra Assad


Os diversos grupos armados de oposição na Síria, que conseguiram derrubar o regime de Bashar al-Assad, foram treinados, armados e financiados por mais de uma década por diversas potências regionais e globais, como Qatar, Arábia Saudita, Turquia, Estados Unidos, Israel e membros da União Europeia, entre outros.

Risco de uma nova teocracia islâmica

Especialistas em Oriente Médio consultados pela Agência Brasil avaliam que a liderança de grupos extremistas islâmicos entre os rebeldes sírios, considerados terroristas por diversos países e organizações, traz o risco de que uma nova teocracia islâmica seja instalada na Síria. O pós-doutor em Ciências Sociais e especialista em Relações Internacionais, Marcelo Buzetto, explica que a guerra da Síria, iniciada em 2011, após os eventos batizados de Primavera Árabe, não foi uma guerra civil convencional. “Esses grupos todos que derrubaram o Assad são financiados por vários países. Cada um dando apoio de alguma maneira, com dinheiro, logística, equipamentos, armas, informações, uns mais discretamente, outros mais explicitamente”, destaca o especialista.

A convocação de jihadistas

No livro A Segunda Guerra-Fria, Luiz Alberto Moniz Bandeira relata a convocação de milhares de jihadistas em diversos países, especialmente na Líbia pós-queda de Muammar Gaddafi. Os jihadistas, adeptos da jihad, acreditam na “guerra santa” para instituir a Sharia, a lei islâmica. Segundo o historiador, milhares de mercenários estrangeiros foram recrutados para sustentar a guerra contra al-Assad com apoio da Turquia, das monarquias árabes sunitas e de potências como França, Inglaterra e EUA.

Interesses geopolíticos

Leonardo Trevisan, professor de Relações Internacionais e de Geopolítica da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), destaca que as monarquias sunitas, assim como Israel e as potências ocidentais, tinham interesse em alimentar a guerra na Síria para isolar o Irã, de maioria xiita e aliada do governo de Assad. “Uma Síria sunita vai, com certeza, expulsar o Hezbollah. E aí entra o interesse de Israel também nessa queda do Assad, que é um interesse econômico em parceria com os árabes moderados, de redesenhar o Oriente Médio”, explica.

Apoio à resistência de Assad

Em contrapartida, Rússia, Irã e o grupo libanês Hezbollah davam sustentação ao governo Assad na luta contra os grupos armados da oposição, que incluíam o Estado Islâmico (EI). O governo de Bashar al-Assad formava, ao lado do Irã e do Hezbollah, o chamado Eixo da Resistência, que é a coalizão contrária à hegemonia dos EUA e de Israel na região. O Irã reconheceu que a queda de Assad prejudica o Eixo da Resistência.

Geopolítica do gás

O pesquisador Marcelo Buzetto destaca que, por sua posição geográfica, a Síria está no centro da disputa geopolítica mundial. Nesse cenário, a construção de um gasoduto para levar petróleo e gás atravessando a Síria teria papel fundamental na guerra iniciada em 2011. “As monarquias árabes, tradicionalmente aliadas dos Estados Unidos, tinham um projeto de gasoduto que apresentaram para Bashar al-Assad a partir de 2000”, avalia Buzetto.

A posição da Turquia

A Turquia, um dos atores mais ativos na guerra, se opõe à política do governo Assad de dar certa autonomia aos curdos, especialmente por temer o fortalecimento do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). “A Turquia não quer ouvir falar de fundar um Estado curdo. Isso ela não quer”, explica Trevisan.

Extremismo e wahabismo

O grupo islâmico fundamentalista Hayat Tahrir al-Sham (HTS), que nasceu como um braço da Al Qaeda do Iraque, apresenta uma ideologia jihadista. O regime de Assad, por outro lado, é secular. Buzetto ressalta que a maior parte dos grupos que tomaram o poder na Síria são adeptos do wahabismo, uma doutrina ultraconservadora. “Esses grupos mercenários e terroristas são, na sua maioria, adeptos da corrente sunita chamada wahabista”, afirma.

Risco de um novo califado

Leonardo Trevisan alerta que existe o risco de um novo califado baseado nas leis islâmicas ser instalado na Síria. “O Talibã também fez esse discurso de moderação quando os americanos saíram e hoje, o Afeganistão não tem mais escola para meninas”, afirma. A Comissão Internacional Independente de Investigação da Síria da ONU relata uma série de abusos de direitos humanos por parte dos grupos rebeldes sírios, incluindo tortura, execuções e prisões arbitrárias.



Fonte: EBC

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