Xica Manicongo: A Primeira Travesti Não-Indígena do Brasil é Homenageada pela Paraíso do Tuiuti no Carnaval 2024
Xica Manicongo, considerada a primeira travesti não-indígena do Brasil, foi uma mulher trans escravizada que viveu em Salvador no século 16. Sua história, marcada pela violência da LGBTfobia, será contada pela escola de samba Paraíso do Tuiuti no enredo "Quem tem medo de Xica Manicongo", desenvolvido pelo carnavalesco Jack Vasconcelos. A apresentação ocorrerá na Marquês de Sapucaí durante o Carnaval 2024, contando com a participação de lideranças e ativistas trans, um evento que coincide com a Semana Nacional da Visibilidade Trans.
Entre as convidadas estão as parlamentares trans Érika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG), além da vereadora Amanda Paschoal (PSOL-SP) e da deputada estadual Dani Balbi (PCdoB-RJ), que se unirão a ativistas dos direitos humanos. A deputada Erika Hilton expressou sua honra em participar do evento, ressaltando a importância de contar a história de Manicongo. “Nós sempre estivemos no carnaval, pessoas trans e travestis, comunidade LGBTQIA+, mas faltava ter nossos heróis e heroínas. Vai ser grandioso fazer o povo conhecer essa história e cantar ‘eu travesti’”, disse.
Hilton também destacou a mensagem que espera transmitir: “Basta de preconceito, intolerância e ódio. Outras Xicas não podem mais ir para a fogueira”.
Ativismo e Direitos Humanos
Entre as ativistas presentes, destaca-se Indianarae Siqueira, fundadora da CasaNem, um centro de cidadania e acolhimento para pessoas LGBTQIA+. Ela aplaudiu o convite da Tuiuti, que reconhece a trajetória de lutas e a responsabilidade da comunidade em defender políticas públicas. Indianarae fez uma crítica aos ataques do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra os direitos das pessoas trans, afirmando que “quando o presidente faz ataques à nossa comunidade, ele declara ao mundo que reconhece a nossa existência”.
Além de Indianarae, o desfile contará com a presença de Keila Simpson, ativista e 1ª travesti doutora honoris causa do Brasil pela UERJ; Gilmara Cunha, ativista LGBTQIA+; Megg Rayara, a 1ª travesti negra a obter doutorado no país; e Symmy Larrat, a 1ª travesti a ocupar uma secretaria nacional LGBTQIA+ no governo federal.
A História de Xica Manicongo
A homenagem a Xica Manicongo visa popularizar a história da escravizada trans que trabalhou como sapateira em Salvador. Relatos históricos indicam que Xica não aceitava o nome masculino e se vestia de acordo com sua identidade de gênero, sendo violentamente reprimida pela época. Acusada de sodomia, ela foi condenada à morte pelo Tribunal do Santo Ofício e queimada viva em praça pública, um triste reflexo das raízes coloniais da violência contra pessoas trans que persiste até hoje.
O Brasil continua sendo um dos países que mais assassina pessoas trans, com 122 homicídios registrados em 2024, segundo a Associação Nacional de Trans e Travestis (Antra). Este número é semelhante à média de 125 assassinatos anuais entre 2008 e 2024.
Desafios e Políticas Públicas
O enfrentamento à violência e a reivindicação por políticas públicas contra a transfobia são fundamentais. Bruna Benevides, presidenta da Antra, enfatizou que a desigualdade social e a falta de políticas públicas são fatores que aumentam o risco de morte para a comunidade. “Quanto menos políticas públicas, mais retrocesso”, afirmou.
O coordenador nacional do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT), Fabián Algarth, lembrou que o direito à vida está garantido na Constituição Federal. Em resposta a preocupações dos ativistas, a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, ressaltou a necessidade de uma atuação comprometida de parlamentares e da sociedade para transformar a cultura política autoritária.