Inah Canabarro Lucas, uma notável brasileira de 116 anos, é reconhecida como a mulher mais idosa do mundo, conforme informações do Gerontology Research Group. Residente em Porto Alegre (RS), a freira tem uma personalidade vibrante: é apaixonada por chocolates, tem aversão a bananas, dirigiu uma banda de música e já viajou por todos os países da América Latina. Notavelmente, em 2022, Inah contraiu Covid-19, mas se recuperou sem grandes complicações.
Outro exemplo inspirador é Laura, de 105 anos, que começou a nadar aos 70 e, atualmente, demonstra uma agilidade surpreendente e uma excelente capacidade cognitiva. Em vez de perder força muscular, como é comum na terceira idade, a nadadora mineira manteve sua musculatura e começou a conquistar medalhas a partir dos 100 anos.
Milton, um veterinário de 108 anos de Brasília, também se destaca. Ele não apenas acompanhava os avanços científicos, mas também lembrava com clareza a importância de cada convidado em sua festa de aniversário de 107 anos, algo que pode ser desafiador até mesmo para pessoas muito mais jovens.
Essas histórias fazem parte de um projeto inovador realizado pelo Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (CEGH-CEL), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP na Universidade de São Paulo (USP). O estudo tem como objetivo mapear o código genético de centenários saudáveis em busca de genes que possam explicar essa longevidade excepcional. Até o momento, foram coletadas amostras de 75 centenários, e a busca por novos voluntários continua.
“Queremos identificar os genes protetores de doenças comuns ao envelhecimento, como demências e problemas relacionados à perda muscular. Embora manter um estilo de vida saudável seja crucial para uma velhice com qualidade, a genética se torna muito mais determinante após os 90 anos”, afirma Mayana Zatz, coordenadora do CEGH-CEL.
Os pesquisadores estão realizando a coleta de sangue e sequenciamento dos genomas dos centenários. Além disso, as células sanguíneas (eritroblastos) estão sendo reprogramadas para se tornarem células-tronco pluripotentes induzidas (iPS), permitindo que sejam diferenciadas em diversos tipos celulares, como musculares, ósseas ou nervosas. Essa técnica possibilita a criação de organoides, que são miniórgãos desenvolvidos em laboratório para estudar o funcionamento dos sistemas corporais.
Os minicérebros obtidos a partir das células doadas pelos centenários brasileiros serão utilizados para investigar os genes associados à proteção contra processos neurodegenerativos, como Alzheimer e Parkinson. Para isso, o projeto não apenas monitora e busca ativamente centenários saudáveis, mas também investe no desenvolvimento de minicérebros mais complexos.
“Estamos trabalhando em duas frentes. A coorte de centenários brasileiros é única no mundo devido à variabilidade genética que resulta da nossa miscigenação, o que pode ajudar a identificar um maior número de genes protetores. Paralelamente, estamos desenvolvendo organoides que simulem de maneira mais abrangente o que ocorre no cérebro dos centenários”, explica Zatz.
Os pesquisadores buscam criar organoides que não apenas contenham neurônios, mas também outros tipos de células do sistema nervoso central, como as micróglias, responsáveis por reconhecer e sinalizar a presença de patógenos e desempenhar um papel crucial no desenvolvimento cerebral. “Esse modelo experimental mais sofisticado permitirá replicar aspectos das funções, interações e organização do cérebro, sendo ideal para estudar tanto o desenvolvimento cerebral quanto distúrbios neurológicos”, afirma Raiane Ferreira, pesquisadora do CEGH-CEL e bolsista de doutorado da FAPESP.
Entretanto, Ferreira alerta para o desafio de adaptar as células iPS, que possuem características embrionárias, para expressar fatores de estresse associados ao envelhecimento, permitindo investigar como ocorre o neuroenvelhecimento. “Estamos buscando entender se a micróglia dos idosos apresenta diferenças, sofrendo menos efeitos do envelhecimento. Essa descoberta será viável por meio dos organoides que estamos desenvolvendo”, conclui Ferreira.