As crianças já vulnerabilizadas socialmente estão mais suscetíveis a riscos no ambiente digital depois da decisão da empresa Meta de redução das normas de moderação das plataformas. A avaliação é do pesquisador Pedro Hartung, diretor de Políticas e Direitos das Crianças do Instituto Alana.
"A internet aumenta as vulnerabilidades que já existem no ambiente offline", explicou Hartung em entrevista à Agência Brasil. Ele identifica que a internet se transformou em um “campo minado” para crianças e adolescentes, e reitera que, quando as plataformas não são pensadas para sobrepor ou superar essas violências, acabam reforçando e ampliando as desigualdades. “Crianças negras, periféricas e meninas estão muito mais sujeitas a essas violências no mundo digital não só pela reprodução dessa violência social, mas pelo aumento dessa violência”, afirmou.
Hartung lamenta a falta de participação das grandes empresas em debates, como o que ocorreu nesta semana em uma audiência pública na Advocacia-Geral da União (AGU) com pesquisadores e representantes da sociedade civil. Ele sublinha que 2025 marca os 35 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e que o país enfrenta desafios para lidar com o que ele chama de “colonialismo digital”. "O afrouxamento da moderação das redes Instagram e Facebook, da Meta, por exemplo, eleva a chance de crimes nas redes", alerta.
Principais Trechos da Entrevista
Agência Brasil: Nesta semana, houve uma audiência pública com a participação de pesquisadores e representantes de diferentes áreas da sociedade civil. O governo está recolhendo subsídios e argumentos nesse embate com as plataformas digitais. Mas os representantes das empresas não foram. O que você pensa sobre isso?
Pedro Hartung: Lamentavelmente, as empresas e as plataformas digitais que operam no Brasil não estiveram na audiência. Escolheram não estar e contribuir para o debate com a perspectiva delas.
Agência Brasil: Antes da decisão da Meta de alterar a moderação de conteúdo, as crianças já estavam vulnerabilizadas, certo?
Hartung: Esse problema de moderação de conteúdo é uma falha da indústria como um todo. É um verdadeiro campo minado para crianças e adolescentes.
Agência Brasil: A internet pode ser mais perigosa para crianças e adolescentes?
Hartung: O que era ruim vai ficar ainda pior. A Meta, ao alterar suas diretrizes, envia uma mensagem de que o espaço da internet não teria lei.
Agência Brasil: Quais são os principais riscos que nossas crianças e adolescentes estão submetidos?
Hartung: Essa internet representa um verdadeiro campo minado, especialmente no Brasil, onde regras protetivas são menos aplicadas.
Agência Brasil: Então não estamos falando de liberdade de expressão?
Hartung: Estamos falando de crimes severos que crianças e adolescentes estão submetidos por uma internet não regulada.
O Papel do Estado e da Sociedade
Agência Brasil: Em 2025, o Estatuto da Criança e do Adolescente completa 35 anos. Deve ser um instrumento de combate para assegurar os direitos?
Hartung: O ECA já estabeleceu quais são os direitos de crianças e adolescentes. É fundamental que as empresas assumam sua responsabilidade.
Agência Brasil: Como a sociedade pode reagir diante disso?
Hartung: Cada um tem o seu papel. As empresas devem garantir os direitos dos usuários, as famílias devem mediar o que as crianças veem na internet, e o Estado deve regulamentar e fiscalizar as plataformas.
Agência Brasil: Quais crianças e adolescentes estão mais vulneráveis com essas novas políticas das plataformas?
Hartung: A internet aumenta as vulnerabilidades que já existem no ambiente offline. Meninas, crianças negras e periféricas estão muito mais sujeitas a essas violências.
Agência Brasil: O Estado brasileiro deve mostrar força no cumprimento da lei?
Hartung: O Estado deve ser fortalecido para cumprir a lei. Há desafios relevantes e a criação de uma governança internacional da internet é essencial.
A entrevista evidencia a urgência de uma abordagem coletiva e comprometida para proteger as crianças e adolescentes no ambiente digital, garantindo que seus direitos sejam respeitados e assegurados.