Memorial da Resistência de São Paulo Comemora 16 Anos com Exposição Reflexiva
O Memorial da Resistência de São Paulo, o único espaço no país dedicado à preservação da memória sobre atos de resistência contra a repressão no Brasil, celebrou 16 anos de atividades nesta sexta-feira (24). Para marcar a data, o museu, localizado no prédio que abrigou por quase quatro décadas o Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops/SP), preparou um mural provocativo e atual.
A obra "Este capítulo não foi Concluído" (2024), do artista Rafael Pagatini, será exposta no mural externo do museu. A instalação homenageia e honra a memória de perseguidos políticos durante a ditadura civil-militar instaurada em 1964, após o golpe que depôs o presidente João Goulart. Pagatini apresenta um painel de 14,2m x 4,5m, composto por 72 páginas dos processos do Superior Tribunal Militar (STM), que documentam as violências cometidas contra esses indivíduos, retaliações a suas críticas.
Para destacar a presença das vítimas da ditadura, o artista gaúcho utiliza folhas de papel com itens como roupas e adereços. Essas páginas são cópias do projeto "Brasil: Nunca Mais", que preservou 1 milhão de documentos de 707 processos do STM entre 1979 e 1985, resultado de um esforço coletivo envolvendo militantes e representantes da Igreja Católica e Presbiteriana.
Uma das interpretações possíveis do painel conecta a obra ao livro "O Processo", de Franz Kafka, escrito em 1914, que explora a angústia do protagonista, Josef K., diante de um julgamento sem explicação. Essa sensação de incerteza e injustiça é um tema recorrente em períodos de regimes autoritários, refletindo a experiência de muitos durante a ditadura.
Exposição Temporária
O mural faz parte da exposição temporária "Uma Vertigem Visionária – Brasil: Nunca Mais", que ocupa uma área de 400 m² e é curada por Diego Matos. A mostra oferece aos visitantes a oportunidade de apreciar obras da Coleção Alípio Freire, criadas por ex-presos políticos como Artur Scavone, Ângela Rocha, Rita Sipahi, Manoel Cyrillo, Sérgio Ferro, Sérgio Sister e Alípio Freire, enquanto estiveram encarcerados durante a ditadura.
Ana Mattos Pato, diretora do Memorial da Resistência, destaca a relevância dos documentos que fundamentam o projeto "Brasil: Nunca Mais", elaborados pelos próprios militares e agentes da repressão. "É uma documentação irrefutável", afirma, ressaltando que esse aspecto diferencia o Brasil da Argentina, que também é abordada em outra exposição no museu, "Memória argentina para o mundo: o Centro Clandestino ESMA".
Muitos visitantes chegam ao memorial sem conhecimento prévio sobre o "Brasil: Nunca Mais", e ao explorarem o espaço, descobrem a profundidade do conteúdo. "O que noto é uma surpresa. Muitas pessoas dizem: ‘ah, tinha na estante do meu avô’, mas quando conversamos, percebemos que se trata de uma memória distante", comenta Ana.
Ela acrescenta que a história da resistência merece ser amplamente divulgada e estudada, pois representa não apenas coragem, mas também um registro único da violência do Estado durante a ditadura. Além disso, uma das principais atribuições das equipes do memorial é coletar depoimentos de pessoas que vivenciaram a repressão. "É a primeira vez que muitas dessas pessoas vêm a público", enfatiza Ana.
Serviço
A exposição "Uma Vertigem Visionária – Brasil: Nunca Mais" estará em cartaz até o dia 27 de julho, no Memorial da Resistência, em São Paulo. A entrada é gratuita e o espaço está aberto todos os dias, exceto terças-feiras, das 10h às 18h.