Advogados defendem indenização pelo Estado a vítimas de enchentes


A administração pública tem o dever de indenizar as vítimas de enchentes que sofreram danos, já que normalmente a responsabilidade do Estado segue a teoria do risco administrativo. Isso significa que não é necessário provar culpa ou dolo por parte da prefeitura ou governo estadual ou federal. O entendimento é do advogado especialista em Direito do Consumidor, Daniel Garroux, que observa que a resposta mais comum da administração pública pode ser que as chuvas que causaram os alagamentos e estragos foram inevitáveis e imprevisíveis.

“Embora a chuva seja inevitável, as consequências da chuva poderiam ter sido evitadas se a cidade tivesse, por exemplo, um plano de drenagem. São Paulo não tem! E vemos prédios sem parar. Então, não tem nada de imprevisível nos locais onde sempre vemos enchentes”, afirmou Garroux.

Ele destaca que as autoridades deveriam estar preparando a capital paulista para esses eventos climáticos, mas, segundo ele, o poder público caminha no sentido oposto, fragilizando a cidade.

“A responsabilidade da administração ficaria configurada pela omissão, por não tomar os cuidados necessários para evitar que essa extensão dos danos ocorresse”, explicou.

Para Garroux, uma das possibilidades para buscar reparação pelos prejuízos é entrar com ações individuais no Juizado Especial ou na Justiça comum, ou coletivamente, com um grupo de pessoas que se une para defender os mesmos direitos. Ele recomenda também a ação civil pública, mas ressalta que é preciso uma entidade legitimada ou uma associação que já funcione há mais de um ano para intermediar o processo.

“Pode-se obrigar o Estado a indenizar os prejuízos ou mesmo a tomar as providências necessárias para que os alagamentos não se repitam. As pessoas precisam saber que têm direito a serem reparadas pelos prejuízos e que a administração tem que responder”, afirmou.

A diretora Jurídica do Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte (IDC), Renata Abalem, concorda com Garroux e menciona o caso do Rio Grande do Sul, onde, após as enchentes do ano passado, foram registradas mais de 5 mil ações protocoladas até junho de 2024 por entidades de defesa do cidadão, associações e Ministério Público.

“A quantidade de ações judiciais contra o estado e os municípios é tão grande, que o CNJ criou até um painel sobre o tema. O site do Tribunal de Justiça de lá disponibilizou um assunto no PJe para facilitar o cadastramento das ações”, disse Renata.

Ela observa que a maioria das ações se baseia na falta de prevenção, em um plano de contingência, na manutenção da infraestrutura e na omissão do poder público.

“As ações estão acontecendo às centenas, e são vários pedidos por danos morais, danos materiais. Na maioria das ações, principalmente nas coletivas e nas civis públicas, é apresentada uma grande quantidade de documentos, de alegações técnicas. E a partir do momento que existem provas com relação a isso, o governo vai ter que responder pelos danos que ele causou pela negligência e pela omissão”, afirmou.

Renata ainda aponta a responsabilização do governo pela falha na assistência aos cidadãos, mencionando a insuficiência de abrigo, água e atendimento médico para as vítimas.

“Por exemplo, nós vimos aquela cena da água entrando no metrô em São Paulo. Aquilo mostra insuficiência na assistência daquelas pessoas. Deveria haver um plano de contingência para retirar aquelas pessoas dali", destacou.

O diretor executivo do Idec, Igor Britto, também se baseia no exemplo do Rio Grande do Sul, onde as decisões do Tribunal de Justiça foram fundamentadas na responsabilidade do poder público por danos em várias regiões.

“Nós não temos uma lei federal específica para isso, mas temos um artigo na nossa Constituição que diz que o Estado responde pelas ações ou omissões de seus agentes públicos. O STF já consolidou que essa responsabilidade é objetiva", explicou Britto.

Ele ressalta que, embora a responsabilidade do Estado seja clara em áreas propensas a alagamentos, a situação se torna complexa em locais onde essa relação é difícil de comprovar.

“O que é inadmissível é as autoridades saberem que aquela população está em risco de enchente e não tomarem nenhuma medida, permitindo que todo ano se repita”, concluiu.

Com o aumento da frequência e intensidade dos eventos climáticos, a responsabilidade da administração pública se torna ainda mais evidente, e a população deve continuar reivindicando seus direitos.



Fonte: EBC

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