Sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) na infância, especialmente entre oito e nove anos, pode aumentar o risco de desenvolver ansiedade, depressão e sintomas como dor de cabeça e dor de estômago. Essa descoberta é parte de um estudo preliminar que será apresentado na Conferência Internacional de AVC 2025, promovida pela American Stroke Association, que ocorrerá em Los Angeles, na Califórnia, entre os dias 5 e 7 de fevereiro.
Os pesquisadores destacam que a relação entre ansiedade e depressão em crianças que sofreram AVC isquêmico, o tipo mais comum, ainda não é totalmente compreendida. “Nossa análise descobriu que os desafios de saúde mental estão presentes em uma taxa maior nesses jovens sobreviventes de derrame em comparação à população em geral”, afirma Nomazulu Dlamini, diretor do Children’s Stroke Program e neurologista da equipe do Hospital for Sick Children, em Toronto, Canadá, e coautor do estudo. Ele acrescenta: “Para crianças, sabemos que os sintomas psicológicos são frequentemente subreconhecidos. Queríamos entender quais crianças correm mais risco de desenvolver problemas de saúde mental e identificar as pistas que nos permitiriam oferecer intervenções que apoiassem uma melhor saúde mental e melhorassem sua qualidade de vida”.
Para conduzir a pesquisa, os cientistas realizaram uma análise retrospectiva de 161 crianças em idade escolar que sofreram um AVC isquêmico entre 2002 e 2020. Elas foram inscritas no registro de derrame do hospital e acompanhadas até a idade adulta. Durante o acompanhamento, as crianças, com idades entre cinco e 17 anos, completaram um questionário que rastreava depressão, ansiedade e dores estomacais crônicas. Com base nas respostas, foram feitas pontuações para esses sintomas e comparadas com crianças da população em geral.
Os resultados revelaram que 13% dos sobreviventes de AVC na infância apresentavam depressão, 13,7% tinham ansiedade, e 17,4% relatavam somatização. A pesquisa indicou que os AVCs ocorreram, em média, entre 8 e 9 anos, representando a faixa etária de maior vulnerabilidade. Além disso, as pontuações médias para humor, ansiedade e somatização foram maiores entre os sobreviventes em comparação com a população pediátrica em geral.
Segundo os pesquisadores, as crianças que manifestaram sinais de somatização tinham mais de dois anos no momento do AVC. “Essas crianças recebem alta após se recuperarem do derrame, mas os pais relatam deficiências significativas na saúde mental. Este estudo destaca o risco de dificuldades de saúde mental ao longo do tempo”, explica Jennifer Crosbie, psicóloga do The Hospital for Sick Children. Ela acrescenta: “Nosso objetivo é conscientizar os pais de que esse é um fator de risco para que eles possam defender seus filhos, porque quanto mais cedo a intervenção, melhor o resultado”.
Heather J. Fullerton, copresidente da Declaração Científica de 2019 da American Heart Association sobre gestão de AVC em neonatos e crianças, e professora de Neurologia e Pediatria, considera que a relação entre transtornos de saúde mental e AVC na infância não é uma novidade. “O que foi novo e surpreendente foi a alta prevalência de somatização (ansiedade que se manifesta em dores de estômago e dores leves) em crianças pequenas. Acho que esse problema é pouco reconhecido”, comenta.
Ela ressalta a importância de os profissionais de saúde rastrearem proativamente os transtornos de saúde mental em todos os sobreviventes de AVC na infância com mais de 2 anos. “Devem estar cientes das manifestações mais sutis de ansiedade em crianças pequenas e incluir isso em seu aconselhamento”, conclui.
Embora as descobertas sejam significativas, o estudo possui limitações, como ter sido realizado em um único local e baseado em questionários, sem avaliações clínicas. Portanto, mais pesquisas são necessárias para fortalecer os achados.