No ano passado, 105 pessoas trans foram mortas no Brasil. Apesar de o país ter registrado 14 casos a menos do que em 2023, permanece, pelo 17º ano consecutivo, como o que mais mata pessoas trans no mundo.
Os dados são do Dossiê: Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024, da Rede Trans Brasil, que será oficialmente lançado no próximo dia 29 nas redes sociais da organização. Este dossiê reúne casos divulgados por meios de comunicação, como internet, redes sociais, jornais e emissoras de televisão, ao longo do ano passado.
Distribuição das Mortes por Região
A maior parte dos casos, 38%, ocorreu na Região Nordeste, que continua sendo a que mais registra mortes de pessoas trans desde 2022. A Região Sudeste aparece em segundo lugar, com 33% dos assassinatos, seguida pelo Centro-Oeste, com 12,6%; pelo Norte, com 9,7%; e Sul, com 4,9% dos casos. Entre os estados, em números absolutos, São Paulo foi o estado com maior registro de assassinatos: 17. Minas Gerais, com 10 casos, e o Ceará, com 9, aparecem em seguida.
“A queda no número de mortes de pessoas trans em relação a 2023 é um pequeno alívio, mas não podemos ignorar que elas ainda acontecem. Isso reflete como o Brasil está em um processo lento e desigual de mudança. Embora existam sinais de progresso, a luta está longe de acabar”, diz Isabella Santorinne, secretária adjunta de Comunicação da Rede Trans Brasil.
A organização é uma das que colaboram com a pesquisa Trans Murder Monitoring, que monitora os assassinatos de pessoas trans e de gênero diverso em nível global. Em 2024, foi registrado o maior número de assassinatos em nível global: 350 pessoas trans. Apenas a América Latina e o Caribe reúnem cerca de 70% dos casos, totalizando 255.
Comparação Global
O Brasil lidera o ranking com 106 mortes notificadas, seguido pelo México (71), Colômbia (25), Equador (14), entre outros.
“É muito contraditório, porque o país que mais consome pornografia trans no mundo é o Brasil e, ao mesmo tempo, é o país que mais mata pessoas trans”, afirma Isabella Santorinne.
Perfil das Vítimas
A maioria das mortes registradas no Brasil é de mulheres trans ou travestis, correspondendo a 93,3% das vítimas. As demais vítimas, 6,7%, são homens trans. A maior parte tinha entre 26 e 35 anos (36,8%), era parda (36,5%) ou preta (26%) e, em sua maioria, trabalhadora sexual.
“Os dados evidenciam e detalham a realidade violenta à qual pessoas trans e travestis são submetidas. Muitos homicídios registrados desde 2016 tiveram como vítimas trabalhadoras sexuais assassinadas ou violentadas em seu local de trabalho, as ruas”, enfatiza Isabella.
O levantamento também mostra que 66% dos casos ainda estavam sendo investigados, enquanto 34% deles resultaram na prisão de suspeitos. Os agressores eram, em 14 casos, companheiros e ex-companheiros; em nove, clientes; e outros nove envolveram execuções relacionadas a dívidas com agiotas ou organizações criminosas.
Análise da Mídia
O dossiê analisou o respeito dos meios de comunicação aos nomes das vítimas. No ano passado, 93,3% dos casos foram respeitados, enquanto 6,7% trataram as vítimas pelo chamado "nome morto", ou seja, o nome pelo qual a pessoa era chamada antes da transição de gênero.
“Faltam políticas públicas voltadas para a proteção de pessoas trans. Embora existam iniciativas pontuais, elas são insuficientes diante do cenário de exclusão e violência que a população trans enfrenta”, conclui Isabella Santorinne.
É urgente criar ações que promovam educação inclusiva, empregabilidade, acesso à saúde e segurança, além de garantir que crimes transfóbicos sejam devidamente investigados e punidos. Sem políticas públicas eficazes, a luta pela sobrevivência e dignidade continua sendo uma batalha diária para pessoas trans no Brasil.