De tão pequenas, as partículas de microplástico são invisíveis a olho nu, mas sua presença é onipresente. Encontradas em alimentos como mexilhões, frutas e legumes, bem como em bebidas como cerveja, chá e água, essas partículas estão também no solo e no ar. Com o aumento da poluição por plásticos, não é surpreendente que fragmentos desse material tenham sido detectados em órgãos humanos, incluindo o cérebro.
Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), liderados pela patologista Thais Mauad, em parceria com o engenheiro ambiental Luís Fernando Amato Lourenço e a bióloga Regiani Carvalho de Oliveira, conseguiram identificar microplásticos no cérebro de oito indivíduos que viveram por pelo menos cinco anos na cidade de São Paulo. As amostras foram coletadas durante autópsias realizadas no Serviço de Verificação de Óbitos da Capital, focando especificamente no bulbo olfatório, uma estrutura que desempenha um papel crucial na detecção de odores.
Os bulbos olfatórios, localizados logo acima do nariz, são a primeira interface do sistema nervoso central com informações olfativas, tornando-se uma potencial via de entrada para partículas e microrganismos no cérebro. Para a coleta das amostras, a equipe utilizou equipamentos que não eram empregados há mais de 40 anos e seguiu um rigoroso protocolo de limpeza, evitando o uso de plásticos durante todo o processo.
Os pesquisadores descobriram de 1 a 4 partículas de microplástico em cada fragmento analisado do bulbo olfatório. As dimensões das partículas variavam de 5,5 µm a 26,4 µm, sendo que a maioria estava na forma de fragmentos ou esferas. A análise revelou que 44% dos microplásticos eram compostos de polipropileno (PP), um dos plásticos mais comuns, amplamente utilizado em embalagens e produtos de consumo.
A detecção dessas partículas no cérebro é alarmante, considerando que o cérebro é protegido por uma barreira hematoencefálica, que impede a passagem de muitos agentes nocivos. Henrique Eisi Toma, químico do Instituto de Química da USP, afirma que "a detecção de microplásticos no cérebro causa preocupação porque ele é o órgão mais blindado do corpo". Estudos anteriores sugeriam que microplásticos poderiam se acumular no cérebro em maior quantidade em comparação com outros órgãos.
Um estudo norte-americano ainda não publicado encontrou evidências de que microplásticos se acumulam no cérebro mais do que em órgãos como fígado ou rins, levantando preocupações sobre os efeitos desses materiais na saúde. Os microplásticos são conhecidos por causar inflamação e morte celular em estudos com animais, mas os efeitos exatos na saúde humana ainda são amplamente desconhecidos.
Pesquisadores italianos acompanharam a saúde de 257 pessoas que passaram por cirurgia para remoção de placas de gordura nas carótidas e descobriram que aquelas com microplásticos em suas placas apresentavam um risco 4,5 vezes maior de infarto ou acidente vascular cerebral. Embora não se possa estabelecer uma relação de causa e efeito, os pesquisadores sugerem que a presença de microplásticos pode exacerbar a inflamação e o estresse oxidativo no endotélio vascular.
Enquanto novos estudos buscam entender melhor o impacto dos microplásticos, a redução do uso de plásticos no cotidiano é uma recomendação prática. A produção global de plásticos continua a crescer, e a poluição por microplásticos representa um desafio significativo. O recente fracasso em estabelecer um tratado global contra a poluição plástica destaca a necessidade urgente de ações políticas e científica para lidar com esse problema.
A detecção de microplásticos em diversos órgãos humanos, incluindo o cérebro, levanta questões importantes sobre os riscos à saúde associados a esses poluentes. As investigações sobre suas consequências e a busca por soluções continuam a ser uma prioridade na pesquisa científica.