Criado em 2010 a partir de um programa da Organização das Nações Unidas (ONU), o conceito dos primeiros mil dias de vida — que abrange os 280 dias de gestação e os 730 dias dos primeiros dois anos — é fundamental para garantir um desenvolvimento físico e mental saudável. Recentemente, pesquisadores de diversos países têm sugerido a ampliação desse período para até o quinto ano de vida, respaldados por novos achados científicos. Um estudo publicado em setembro no periódico Nature Reviews Endocrinology reforça essa proposta.
A pesquisa australiana, baseada em uma revisão de estudos, destaca a importância de reduzir o risco de obesidade durante os primeiros 2 mil dias. A pediatra e endocrinologista Lindiane Gomes Crisostomo, do Hospital Israelita Albert Einstein, afirma: “É melhor prevenir o quanto antes, evitando que a obesidade se instale, porque o tratamento é muito mais complicado.” Durante esse período, o organismo é mais sensível às influências do ambiente, apresentando uma maior plasticidade. Por isso, intervenções adequadas podem ter efeitos duradouros.
“O ideal é começar já no pré-natal, com estímulo a uma alimentação saudável pela gestante, e seguir com incentivo ao aleitamento materno após o parto”, comenta Crisostomo. A introdução alimentar, realizada de forma cuidadosa após os 6 meses de vida, é crucial para a formação de bons hábitos. Combater o sedentarismo é outra ação essencial, que deve ser lúdica para que a criança desenvolva uma apreciação por atividades físicas desde cedo.
Além disso, a pediatra ressalta a importância de estabelecer uma rotina de sono adequada. Cada fase da infância requer um número específico de horas de sono, e a falta dele pode afetar a produção de hormônios como o cortisol, que está relacionado ao aumento da pressão arterial, ganho de peso e risco de diabetes.
Crisostomo também alerta sobre o uso de telas: “Devem ser proibidas até os 2 anos e, após esse período, deve-se ter cautela.” O uso excessivo de dispositivos pode interferir no sono e desestimular brincadeiras e exercícios físicos, além de impactar o hábito alimentar, uma vez que as crianças podem se distrair com os aparelhos durante as refeições, sem perceber o que estão comendo.
A pesquisa australiana fornece recomendações específicas para cada fase dos primeiros 2 mil dias de vida de uma criança:
Na gestação: Durante os nove meses, o foco deve estar em uma alimentação equilibrada e na prática de atividade física, promovendo um ganho de peso saudável. O acompanhamento pré-natal é crucial para detectar precocemente o diabetes gestacional e outros distúrbios.
Até os 6 meses: O aleitamento materno deve ser incentivado, com apoio à mãe. É importante estabelecer uma rotina de sono e estimular o desenvolvimento motor por meio de brincadeiras.
Dos 6 aos 12 meses: O bebê inicia a introdução alimentar, que deve ser variada e rica em vegetais e alimentos nutritivos. A habilidade de manipular alimentos começa a se desenvolver por volta dos 9 meses.
Do 1º ao 3º ano de vida: Nessa fase, a criança começa a falar e andar, e atividades lúdicas que permitam correr e escalar são recomendadas. Envolver a família no planejamento e preparo das refeições é essencial.
Do 3º ao 5º ano de vida (pré-escolar): O equilíbrio e a coordenação se aprimoram, e a criança compreende melhor os sinais de saciedade. A prática de atividades físicas, como esportes ou dança, deve ser estimulada, assim como a continuidade de bons hábitos alimentares.
Essas estratégias são fundamentais para prevenir o sobrepeso e a obesidade na vida adulta, promovendo uma saúde integral desde os primeiros dias de vida.