Curso ensina letramento racial a trabalhadores do SUS


No contexto das comemorações ao Dia da Consciência Negra, celebrado pela primeira vez como feriado nacional neste ano, a Escola Politécnica em Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e o Campus Virtual Fiocruz lançaram o curso online gratuito Letramento racial para trabalhadores do SUS.

A formação, com foco em trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS), busca conscientizar sobre a necessidade de desconstruir práticas racistas e promover a diversidade e a equidade no campo da saúde.

Coordenado pelas professoras Regimarina Reis e Letícia Batista, a iniciativa é fruto de uma parceria entre a Fiocruz e as universidades federais da Bahia (UFBA), do Maranhão (UFMA), do Rio de Janeiro (UFRJ) e Fluminense (UFF), com apoio do Ministério da Educação (MEC). Durante a capacitação, serão abordados temas como as relações entre o racismo e a saúde como direito no Brasil e a prática antirracista como princípio do trabalho em saúde. O objetivo é reconhecer e questionar estereótipos, preconceitos, discriminações e injustiças raciais.

A professora Regimarina Reis comentou sobre o curso: “Desenvolvemos o curso partindo da evidência inquestionável de que a população negra é desproporcionalmente afetada pelas desigualdades sociais no Brasil”.

Letícia Batista, coordenadora adjunta do curso, destaca que “o racismo é uma produção social e sua ação impacta também o SUS, reproduzindo iniquidades em saúde”. A pesquisadora reforça que a capacitação não busca apenas reconhecer o racismo, mas fortalecer a produção de ações antirracistas no âmbito das políticas voltadas para a saúde.

A formação é a primeira desenvolvida no âmbito do edital Inova Educação – Recursos Educacionais Abertos, iniciativa da Fiocruz. O curso é aberto para todos os interessados pelo tema e pode ser adaptado e utilizado em outros materiais. “É nesse sentido que entendemos a importância do curso, como processo formativo introdutório, com abrangência nacional, que afirma e difunde o lugar da questão racial para compreender as relações sociais e os processos de saúde e adoecimento no país. O racismo é um obstáculo central para a realização da saúde como direito no Brasil, devendo ser enfrentado”, resume Reis.

“Com racismo não há saúde, com racismo os princípios do SUS são irrealizáveis em sua plenitude. A expectativa é que mais iniciativas formativas e de práticas antirracistas possam ser realizadas ao nível nacional e local”, completa.

Letramento racial

No Brasil, 55,5% da população nacional se identifica como negra, sendo 45,3% (92,1 milhões) autodeclarada parda e 10,2% (20,7 milhões) preta, segundo o Censo Demográfico 2022, realizado pelo IBGE. Apesar de representar a maioria da população, pessoas negras ainda têm menos acesso aos serviços de saúde no país, principalmente em comparação às pessoas brancas. Apenas 74,8% das pessoas pretas e 73,3% das pessoas pardas consultaram um médico nos 12 meses anteriores à divulgação da Pesquisa Nacional de Saúde 2019, enquanto entre pessoas brancas, essa proporção passa para 79,4%.

“Fato é que negras e negros no país vivem em piores moradias, têm menos acesso à educação, apresentam piores condições de saúde, recebem os menores salários, ocupam menos as posições de poder e são mais encarcerados, entre outros indicadores sociais que evidenciam a sub-representação negra em relação à população branca. Isso reflete o processo de formação da sociedade brasileira, que é fortemente ancorado em hierarquias raciais e tem o racismo estrutural como tecnologia de poder”, reflete Reis.

Para a coordenadora, a sociedade brasileira é construída com base no racismo estrutural, que organiza e orienta o cotidiano de pessoas negras e brancas. “Essa forma de discriminação está presente não apenas nas relações interpessoais, mas também nas instituições públicas, incluindo o SUS. O racismo presente na sociedade é também produzido e reproduzido nas organizações de saúde, no trabalho em saúde e na formação dos trabalhadores da saúde.”

Reis ainda aponta para a negligência de debates sobre o tema ao longo da formação dos trabalhadores da área da saúde: “O racismo é promotor de adoecimento individual e coletivo, apesar disso, as questões raciais não são abordadas na formação dos trabalhadores da saúde, e nem nos processos de trabalho. Há uma interdição dessa discussão em todas as categorias profissionais e níveis formativos em saúde.” Até o momento, a formação conta com cerca de 7 mil inscritos, de todas as 27 unidades da Federação.



Fonte: EBC

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